𝔖𝖺𝗍𝖺𝗇.

No coração sombrio da velha cidade de Amiens, onde as noites se estendiam como veludo e os ventos pareciam singelos sussurros, existia uma mansão erguida à margem da floresta. Nela, vivia um homem chamado Damian Blackwell, um solitário que, desde jovem, nutria uma inquietante curiosidade pelos mistérios que o mundo não ousava revelar. Seus olhos, profundos e vazios, eram como dois abismos sem fundo, sempre em busca de algo além do visível.

Durante anos de sua vida, Damian buscara conhecimento nos livros antigos de alquimia, ocultismo e filosofia. Mas nada o preenchia verdadeiramente. Sentia uma ausência, como se algo ou alguém estivesse distante, aguardando ser encontrado. Seus pensamentos frequentemente se perdiam em um vago anseio por algo mais, algo que os mortais não podiam compreender.

Certa noite, enquanto folheava mais um livro empoeirado, ele encontrou uma agem que o paralisou. Era um convite, uma promessa de encontro com o que ele mais buscava. As palavras, escritas com uma caligrafia que parecia se mover, revelavam um nome que Damian nunca vira antes, "Amaros", não como um Deus, mas como um ser que se tornara o guardião dos próprios humanos, o amigo dos que ousavam ver a verdade por trás das cortinas da realidade.

Decidido, Damian se aventurou pela floresta, onde o vento sussurrava e as árvores pareciam vigiar cada o seu. Após horas de caminhada, chegou à clareira onde um altar de pedra estava erguido, coberto por musgo e símbolos esotéricos. Ali, na penumbra, uma figura aguardava — não uma forma ameaçadora, mas uma presença reconfortante. Ele era belo, de uma beleza que parecia impossível para os olhos mortais, e sua voz, suave como o murmúrio da brisa, trouxe uma calma imediata.

"Damian Blackwell, filho da noite, por que buscas o que outros temem?" — Perguntou a figura, com um sorriso que não era nem bom nem maligno, apenas... aconchegante.

"Procuro a verdade." — Respondeu Damian, sentindo a certeza em seu coração. "Procurava alguém que me compreendesse, alguém que não me rejeitasse por minhas dúvidas. Alguém que não temesse a escuridão."

"Tu não temes." — Disse a figura com um brilho nos olhos. "A escuridão não é o mal, mas o espaço onde a verdade pode ser revelada. Eu sou o amigo de todos os que ousam caminhar por esse caminho."

Damian olhou nos olhos de seu estranho visitante, uma sensação de familiaridade invadindo sua alma. "És Lúcifer, o anjo de luz?"

"Não sou o que dizem acerca de minha pessoa." — Respondeu, dando um o à frente. "Não sou um deus para ser temido ou adorado. Sou aquele que oferece a verdade nua, sem disfarces. Não sou o oposto de Deus, como muitos creem. Sou aquele que simplesmente caminha ao lado dos homens, mostrando-lhes as possibilidades além da fé cega."

Damian, agora imerso na presença daquele ser, sentiu um profundo alívio. Durante toda a sua vida, ele procurara por um propósito, por uma razão que o conectasse àquilo que estava além daquilo que seus olhos podiam ver. Lúcifer, no entanto, não lhe ofereceu respostas prontas, mas sim uma promessa de liberdade. Ele não era um ser vingativo ou cruel, mas um ser racional que mostrava as sombras onde a luz não alcançava, permitindo que Damian fosse o próprio mestre de seu destino.

"Você está livre, senhor Blackwell. Livre para escolher." — Disse Lúcifer, com uma voz que parecia ecoar em sua mente. "A verdadeira liberdade não vem de seguir ordens ou de adorar um ser distante. Ela vem da capacidade de olhar para dentro de si e aceitar quem realmente somos."

A partir daquele momento, Damian não foi mais o mesmo. Ele voltou à sua mansão, mas algo havia mudado dentro dele. Ele não via mais a vida como uma sucessão de caminhos a serem seguidos, mas como um campo aberto, onde poderia semear suas próprias sementes. Lúcifer, seu conselheiro, seu confidente, estava sempre ao seu lado, não como um mestre, mas como um companheiro de experiências. No período noturno, com seus segredos e sombras, tornou-se o manto sob o qual Damian agora caminhava livremente, sem medo. A solidão deixou de ser sua inimiga, e a escuridão ou a ser sua aliada. Ele aprendera que, às vezes, a verdadeira luz não está em iluminar tudo ao redor, mas em dar àqueles que buscamos o espaço para encontrar a sua de forma individual.

Desse modo, Damian Blackwell viveu seus dias, guiado por seu amigo silencioso, enquanto o mundo continuava a temer o que não compreendia, e ele, no entanto, abraçava as sombras com eterna e devota gratidão..